quinta-feira, novembro 27, 2008

Yes, we can! Mas é esta avaliação que queremos?

Reflexões acerca da avaliação de professores


O conflito entre o Ministério da Educação e os professores ameaça arrastar-se paralisando as escolas e prejudicando, talvez irremediavelmente, o ensino de muitas crianças e jovens. Dado o muito que já se disse e escreveu sobre o tema, opto por não discutir a avaliação em si, tanto mais que o consenso em torno da necessidade de avaliação parece ser um dado adquirido, e centro-me no pecado de raiz deste modelo de avaliação: o “centralismo burocrático iluminado”, mesmo quando bem intencionado.

Com efeito, a conflitualidade em torno do modelo de avaliação resulta de um equívoco de base na gestão do sistema de ensino, a saber, a crença de que o Ministério de Educação é quem melhor sabe como devem ser governadas as escolas: como tive já tive oportunidade de referir, em Portugal, o Ministro da Educação vê-se sobretudo como um Ministro das Escolas,um Super-director, se quisermos. Ele identifica os problemas e desenha as melhores soluções,que procura depois ver aplicadas a todas as escolas. Não chega a ser o absolutismo iluminado do Marquês de Pombal, mas o princípio é o mesmo.

Foi assim com as Actividades de Enriquecimento Curricular e com as Aulas de substituição; foi assim com os quadros interactivos e com o Magalhães; foi assim com a escolha administrativa de milhares de professores titulares; pretendia-se que fosse assim com o modelo de avaliação. Aliás, tinha mesmo de ser assim: ao manter o concurso nacional de professores, ou seja, ao determinar que de quatro em quatro anos os professores concorrem todos contra todos pela colocação na escola da sua preferência, o ministério estava obrigado a encontrar um modelo de avaliação que, mais do que contribuir para o melhor desempenho, tinha como preocupação comparar professores entre si. Simplesmente não é possível desenhar um sistema dito “de avaliação” que possa comparar dezenas de milhar de professores, espalhados por centenas de escolas, inseridas em realidades sociais e culturais tão díspares.

O incómodo que perpassa as declarações de professores ao longo desta crise parece resultar deste equívoco de base. Quem garante ao professor “João” da Escola Secundária de Silves, que a professora “Joana” da Escola Secundária de Bragança,com quem vai concorrer directamente no próximo concurso nacional, está a ser avaliada de uma forma comparável, mesmo que as variáveis sejam idênticas? A solução passa por apostar num novo modelo de gestão do sistema de ensino.

Abdicar de vez do “centralismo burocrático iluminado” e devolver as escolas às comunidades. Dar-lhes liberdade para contratar e avaliar os seus professores, apoiá-las a adquirir capacidades para encontrar as melhores soluções para a resolução dos seus problemas e as melhores fórmulas para a promoção do sucesso dos seus alunos e serem responsabilizadas pelas decisões que tomarem.

Muitos países já o fi zeram. Há dias, tivemos na Gulbenkian a apresentação do exemplo da Nova Zelândia (cf. http://www.liberdade-educacao.org/ciclo/fle.htm). A julgar pelo lugar cimeiro que ocupa nos estudos internacionais de avaliação dos sistemas de ensino, não se tem dado nada mal. Porque é que os portugueses não acreditam que conseguem fazer o mesmo. Temos de acreditar que sim. E também dizer “yes, we can”.

Fernando Adão da Fonseca

Presidente do Fórum para a Liberdade de Educação / PÁGINA 1 / Rádio Renascença / 26-11-08

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