Carta aberta aos dirigentes da FENPROF
Caros colegas, dirigentes da FENPROF
Quarenta mil colegas nossos estão a viver o drama do desemprego. Noventa por cento deles profissionalizados, a grande maioria com vários anos de prática docente no Ensino Público; mas, desgraçadamente, pelo menos 15 mil nem sequer poderão receber um subsídio de desemprego, já que o trabalho que se viram obrigados a aceitar foi pago a recibos verdes, tal como vocês muito bem referem.
E, perante este drama, o Governo ainda vos insulta porque, como dirigentes sindicais, vocês recusam aceitar esta situação, como se estivessem a defender a criação nas escolas de postos de trabalho desnecessários, apenas para responder a estes milhares de professores expulsos do seu trabalho de ensinar e educar.
Pela nossa parte, só pode merecer repúdio esta tão torpe atitude governamental.
Partilhamos convosco a afirmação de que a situação de desemprego da esmagadora maioria dos nossos colegas só existe porque o Governo levou à prática um plano de contra-reformas, desmantelando a Escola Pública democrática, inclusiva e destruindo a nossa carreira profissional:
- Milhares de escolas encerradas, com todas as consequências negativas denunciadas por estudiosos com autoridade para o afirmar.
- Aumento de 10 e mais anos de serviço para atingir a idade da reforma;
- Mais de quarenta mil alunos, com necessidades educativas especiais, a quem foi retirado o legítimo e humano direito a uma resposta educativa adequada, enquanto alguns dos professores com esta especialidade são desviados para substituir nas AECs colegas do regime geral.
- Aumento do número de alunos por turma, até ao limiar de 28 e 30, independentemente de nelas se encontrarem alguns a exigir uma resposta educativa especializada;
- Milhares de docentes sujeitos de novo a um trabalho ultra precário, contratados por empresas privadas ou pelas autarquias;
São estas medidas – postas em prática para que o Orçamento do Estado respeite as exigências Comissão Europeia – que o Governo esconde aos olhos da opinião pública, usando, de forma despudorada, o slogan medíocre e falacioso, de que “os professores estariam a exigir, com os seus sindicatos, que o Governo lhes invente empregos”.
A indignação – que fez com que 100 mil de nós manifestássemos em Lisboa, em Março passado – não pode senão crescer.
Tanto mais que, para aqueles que estão nas escolas, é a hecatombe que se abateu sobre todos os pilares do Ensino.
São eles que afirmam ser impossível realizar uma prática de ensino de qualidade, quando:
- As suas turmas são tão numerosas, e com alunos tão diferenciados, alguns exigindo estruturas de apoio especializado que as escolas não têm condições para criar;
- Há crianças do 1º Ciclo que irão ter Matemática ou Língua Portuguesa no final do dia, privilegiando a leccionação das AEC com os tempos mais favoráveis à aprendizagem – os tempos da manhã.
- Os docentes, em vez de poderem centrar-se no estudo das matérias e na preparação dos planos pedagógicos, de os discutir e partilhar com os outros colegas – num clima de cooperação saudável –, estão centrados na sua própria avaliação, no seu portefólio, uma avaliação destinada a dividi-los em categorias e a individualizá-los, para que, no final, pelo menos dois terços de entre eles fiquem “congelados” em pouco mais do que metade da carreira.
Estes obstáculos à construção da Escola aumentam, de forma ainda mais gritante, quando os professores do primeiro ciclo são sujeitos a horários de trabalho de 26,5 horas semanais, no contacto directo com os alunos, mais as reuniões, o que obriga a terem que fazer a sua formação aos sábados, bem como a preparar ar as aulas no tempo que deveria ser para a família e para o seu descanso. Esta situação é imposta a todos os professores independentemente do número de anos de trabalho.
Estas medidas são, mais uma vez, para baixar o Orçamento do Estado referente ao Ensino.
É impossível fazer viver o princípio sagrado da liberdade de ensinar, quando se está sujeito a ter que respeitar resultados de avaliação do desempenho docente definidos sem sequer existir da parte dos professores um diagnóstico das suas turmas, sem se ter em conta todo o conjunto de variáveis que, ao longo de um ano lectivo, interagem com o processo de desenvolvimento de cada aluno. Como aceitar esta aberração pedagógica? Como aceitar que o trabalho dos professores e dos alunos seja objectivado dentro de grelhas estatísticas?
Não pode haver liberdade de ensino, quando o ambiente vivido na escola deixou de ser de liberdade e de autoridade democrática. Em vez da liberdade, crescem o medo e as condições para emergirem os traços mais negativos que um educador combate – a prepotência e a subserviência – já que o poder ficou individualizado na pessoa de um director. Este, por sua vez, está dependente de um Conselho Geral, no qual prevalece, sobre quem tem o saber e a autoridade para ensinar e formar, o voto maioritário dos autarcas, dos pais e de outras entidades estranhas ao Ensino.
Em vez da autoridade do professor, responsabiliza-se este pelo insucesso dos alunos, protegidos por um estatuto do aluno que os deixa completamente sozinhos, perante um problema que os ultrapassa em várias dimensões.
Caros colegas, dirigentes da FENPROF
Caros colegas, membros da Plataforma sindical dos Professores
Numa situação de hecatombe, é necessário e urgente deitar contas à vida e fazer uma retrospectiva do último ano lectivo.
A situação não melhorou em nada, pelo contrário.
Os professores precisam, mais do que nunca, de sentir a força dos seus sindicatos, na preparação de acções de unidade de todos nós, como já mostrámos que sabemos fazer.
Não se pode estar a agir nesse terreno como prisioneiro de acordos com um Governo que nos destrói, física e moralmente, que destrói a Escola pública, por que só aceita cumprir as exigências da Comissão Europeia.
Rompam com eles, retirem o vosso nome do “Memorando de entendimento”.
Unamo-nos para exigir, desde já que o Ministério da Educação cumpra as disposições praticadas na Região Autónoma dos Açores. Lá, os professores não estão subdivididos entre titulares e outros; não existe prova de ingresso na carreira; as actividades de enriquecimento curricular são asseguradas por docentes contratados pelo Governo Regional, no quadro dos agrupamentos das escolas; o Governo comprometeu-se a não pôr em prática o novo modelo de gestão e a fazer a contagem integral de todo o tempo de serviço… e a pagá-lo.
Pela nossa parte – que somos pela revogação do ECD, pelo restabelecimento da democracia nas escolas, pela retirada de todas as contra-reformas realizadas no Ensino, pela defesa da Lei de Bases do Sistema Educativo, aprovada em 1986, e dos princípios da Escola Pública consignados na Constituição da República – consideramos que não há outro caminho senão o do reforço da FENPROF e dos seus sindicatos, reforço que exige a sua independência para ficar com as mãos livres para o combate democrático.
Consideramos que não existe outro caminho senão o da retirada da vossa assinatura do texto desse “Memorando”.
Primeiros subscritores: Ana Maria Simões (Profª EB2,3 Alto da Barra – Oeiras); Carmelinda Pereira (Profª EB1 aposentada); Conceição Rolo (Profª aposentada); Maria da Luz Oliveira / Samira Vaz Osório / Adelaide Monteiro Cunha / Teresa de Mello e Abreu / Mª da Conceição Raposo de Medeiros Tomé / Mª Cristina Pinto Martins / Marinda Odete Monteiro Gomes (todas professoras da EB1/JI Sá de Miranda – Oeiras), Adélia Gomes (Profª EB1 aposentada); Mª Manuela Leitão (J.I. Palhaço, Linda-a-Velha).
Subscrevo esta carta:
NOME ESCOLA SINDICATO CONTACTO
Leiam aqui
a resposta de Mário Nogueira à
Carta Aberta à FENPROF
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