"A política do Governo é a da destruição da escola pública e das suas características essenciais"
No início do último ano lectivo de Maria de Lurdes Rodrigues, o deputado do PCP faz o balanço do mandato da ministra. E escreve-o na primeira pessoa.
Sei que pode parecer demasiado simplista, mas na verdade, considero que nestes quatro anos de mandato de Maria de Lurdes Rodrigues praticamente nada melhorou. A não ser talvez a diminuição da ilusão que os portugueses tinham em torno do Governo PS. Hoje os portugueses percebem claramente que é um Governo que executa políticas de direita. Essa consciência está hoje mais consolidada que em 2005.
A política do actual governo é a da destruição da escola pública e das suas características essenciais plasmadas na Lei de Bases do Sistema Educativo. Uma análise ao actual sistema de ensino com ponto de comparação em 2005 leva-nos a apontar que:
- o parque escolar se continua a degradar em termos materiais e que inúmeras escolas do básico e do secundário não dispõem de condições mínimas para as actividades lectivas;
- as actividades chamadas de enriquecimento curricular vieram retirar do plano curricular um conjunto de matérias que deveriam integrar obrigatoriamente esse plano de acordo com a LBSE (por exemplo, as actividades físicas e a formação musical). Além disso, essas actividades vieram deteriorar as condições de ensino, sendo que são realizadas em locais não aptos para o ensino e são levadas a cabo muitas vezes por profissionais que não são da área educativa.
- as condições de trabalho dos funcionários não docentes têm vindo a sofrer uma acentuada degradação, nomeadamente fruto da política do Governo para a função pública, mas também com a perspectiva de passagem aos quadros das autarquias num regime de flexibilidade que não respeita os funcionários. Além disso, o continuado desinvestimento no reforço dos meios humanos para a Educação, leva a uma diminuição de efectivos nas escolas, obrigando as escolas a recorrer a recibos verdes e a outros expedientes de contratação precária. Isto significa que existem menos profissionais nas escolas, mais trabalho para os colocados e menor capacidade de intervenção nos problemas escolares, nomeadamente na promoção de um ambiente de convívio escolar e na redução da violência em meio escolar.
- a escola perdeu a sua componente democrática, através da aplicação do novo Regime Jurídico da Gestão e Administração dos Estabelecimentos de Ensino. A escola é cada vez mais gerida de forma estritamente empresarial. No interior, por um director escolhido pelo seu currículo. No exterior, por uma empresa: a Parque Escolar E.P.E e no Ministério pelos interesses das escolas privadas e de agentes empregadores cada vez mais distantes do interesse nacional.
- o estatuto do aluno dos ensinos básico e secundário veio reforçar a linha de culpabilização do estudante por tudo quanto vai mal no interior da escola pública. O estado demite-se das suas responsabilidades, ignora o contexto social e educativo de cada escola e de cada estudante e elabora um código penal para supostamente combater o insucesso e abandono. Mesmo que os números melhorem, manipulados ou não, não é com uma política de autoritarismo e responsabilização do estudante que a educação em Portugal será promovida ao lugar que merece.
- os direitos e a qualidade de vida dos professores e educadores têm sofrido nos últimos anos o maior ataque de todos os tempos. A ministra escolheu debilitar a escola pública, mas sempre soube que ia contar com a resistência de todos os que nela trabalham. Por isso mesmo, são esses o primeiro alvo político do Ministério.
- se mantêm os exames nacionais e a gradualmente crescente elitização do ensino por escolas e por ano de escolaridade. Existem escolas de elite onde o investimento do estado não se faz esperar e escolas provisórias há mais de 28 e 30 anos sem qualquer intervenção por parte do Ministério. Escusado será dizer quem estuda numas e quem estuda nas outras.
- a supressão de cursos tecnológicos para a sua substituição forçada por cursos profissionais, mostrando claramente as intenções de promover uma linha de ensino que funciona apenas como uma preparação para os mercados de trabalho da baixa qualificação e baixos salários, linha essa que corta aos estudantes a perspectiva de prosseguimento de estudos, particularmente para o ensino superior.
- a arrogância e prepotência do Ministério contribuíram sempre para um ambiente de crispação que não beneficiou a escola. A imposição das medidas, sem ouvir ninguém e sem acolher contributos, reagindo mal a toda a crítica, fez chegar às escolas um ambiente de ruptura e esgotamento, sentido principalmente por professores e funcionários e reflectido obviamente na qualidade de ensino e na preparação do estudante.
- a política de atropelo aos direitos dos estudantes agravou-se. Diversas associações de estudantes viram-se limitadas no exercício dos seus direitos.
O que falta fazer agora é muito mais do que aquilo que faltaria em 2005. No entanto, para resumir, três grandes linhas de acção:
i. revogação do actual estatuto da carreira docente e substituição por um estatuto que dignificasse a função docente e reforçasse o processo ensino-aprendizagem; revogação do actual diploma de gestão e de administração das escolas e a sua substituição por uma "lei da gestão democrática das escolas" como a que será discutida na Assembleia da República no dia 25 de Setembro proposta pelo PCP.
ii. um sério investimento na Educação, apostado na melhoria das condições materiais e humanas das escolas.
iii. O cumprimento integral da Lei de Bases do Sistema Educativo e da Constituição da República Portuguesa, leis maiores do nosso edifício legislativo e que encerram as soluções para os principais problemas que hoje se sentem no sistema educativo. É aliás por incumprimento deliberado e persistente do quadro legal que o sistema de ensino se tem degradado com tanta intensidade.
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