terça-feira, maio 20, 2008

O Ensino do nosso Descontentamento + Comentários

[do meso autor e da mesma fonte, diário económico]

Em Lisboa, sem Física, uma escola pública preencheu
todas as 135 vagas em Engenharia Civil, outra,
exigindo Física e Matemática, ficou com 15% de vagas
por preencher.

Manuel Gonçalves da Silva

Em Lisboa, sem Física, uma escola pública preencheu
todas as 135 vagas em Engenharia Civil, outra,
exigindo Física e Matemática, ficou com 15% de vagas
por preencher. A frágil qualidade do ensino superior
de engenharia assenta em incompetências e compadrios,
como se ilustra com casos paradigmáticos, que urge
eliminar. Acesso facilitista à Engenharia

* A admissão a Civil, Electrotécnica ou Mecânica deve
exigir, ao menos, nota de 9,5 na prova de Física. Os
exames têm, porém, tido média em torno de 8, o que
reduz muito a ocupação das vagas disponíveis e o
subsídio estatal. Qual a solução adoptada pela maioria
das Escolas? Não exigir a prova de Física!

A manobra é rentável: por exemplo, em Lisboa, sem a
exigência da Física, uma escola pública preencheu
todas as 135 vagas em Engenharia Civil, enquanto
outra, exigindo Física e Matemática, ficou com 15% de
vagas por preencher, teve um corte de 15% no
orçamento, prejuízos de planeamento e transmitiu uma
imagem de insucesso. Estes procedimentos são
intoleráveis e requerem intervenção. Complementarmente
é indispensável recuperar o aprendizado da Física,
alicerce básico da Engenharia.

Médias mentirosas no acesso à Universidade
Outro truque é facilitado pela regra oficial de
cálculo da média na selecção dos "melhores" alunos:

* O peso da classificação do ensino secundário não
inferior a 50% e o das provas de ingresso não inferior
a 35 %.

As notas do "secundário", sabe-se, são mais altas do
que as das provas de ingresso. Logo, várias Escolas
atribuem 60% ao "secundário", em vez dos 50%
atribuídos pelas Escolas de maior rigor, e "derrotam"
a concorrência, conseguindo melhores médias aparentes
e mais alunos sem que a habilidade transpareça.

A comparação qualitativa entre Escolas, através da
média de entrada mais baixa, isto é, do "último
admitido", é outro logro: se uma Escola admite 120
alunos e outra 35, compara-se o 35º classificado da
segunda com o 120º da primeira! Se uma Escola exige
Física e a outra Desenho faz algum sentido comparar as
médias respectivas?

Mais (investigação) é menos?
O novo "eduquês" inclui um mestrado de 2º ciclo (nome
dado aos 4º e 5º anos, pós licenciatura de 3 anos) que
requer 42 unidades de investigação e um mestrado
integrado com 5 anos corridos (embora kafkianamente
exija diploma ao fim de 3) que apenas exige 30
créditos de investigação. Como autoriza o ministério
um ou outro?

A Direcção Geral pediu um parecer a dois académicos da
química da Universidade do Porto, um deles proeminente
na Ordem dos Engenheiros, e a um terceiro de área não
tecnológica. O parecer é desastroso, muito pior do que
o Ensino que subjuga:

* "Projecto" não deve ser ensinado nas Universidades,
onde o ensino não curricular deve ser "de natureza
científica". O erro é tal que dispensa análise.

* Mestrados integrados (os tais com menos
investigação) são, transcreve-se, de apoiar apenas nas
Escolas que desenvolvem nessas áreas de engenharia ...
investigação...em unidades ... com Muito Bom ou
Excelente.

Aos outros mestrados, os de 2º ciclo, que exigem mais
40% de investigação ... não é pedida essa qualidade.
Com este incompetente parecer, a Direcção Geral (DG)
vem introduzir graves iniquidades na engenharia
nacional.

Amigos só precisam de "Bom"?
Definido o critério acima descrito, critério que a lei
não comporta, a DG aplica-o, ou não, conforme a
arbitrariedade que lhe é consentida. Houve cursos sem
Muito Bom que foram aprovados. Houve cursos sem
unidade de investigação que foram aprovados. Sem que
se entenda e sem que o Ministro responda aos recursos
apresentados pelos rejeitados.

Engenharia Civil para Biólogos?
Para terminar com humor em alta, diz-se que está quase
aprovado um mestrado integrado de engenharia civil,
associado ao trivial "Bom", porque terá colaboradores
num Centro de Departamento de Zoologia que uma
Comissão de Biólogos classificou de "Muito Bom". Será
possível?

A alegada baixa qualidade das Escolas Públicas de
Engenharia vai ser sujeita a uma Agência de
Acreditação, com avaliadores estrangeiros, criação
favorita do ministro e de avulsos académicos, em geral
sem experiência profissional.

Os factos justificam outra proposta: que seja criada
uma Agência de Acreditação para decidir quem pode
exercer funções públicas adstritas ao Ensino,
incluindo as de Director Geral e superiores.


Manuel Gonçalves da Silva, Professor Catedrático da
Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNL emembro do
painel Ciência e Sociedade

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Comentários

vg
Felizmente que a minha Ordem não passa título de
engenheiro apenas pelo "canudo".Por isso"sabem quem "
até nem estava interessado...A degradação da educação
é uma factura que vai ser paga por várias gerações.Não
se percebeu que a explosão do número de
alunos,legítima e democrática,impunha melhor qualidade
do ensino ,em vez do laxismo cómodo.Bem tuga...

LL
E ainda há quem bata palmas a Mariano Gago... É a
bandalheira esquerdóide no seu melhor! Falta pouco
para tentarem inscrever o direito ao "canudo" na
Declaração Universal dos Direitos do Homem. Já agora
dava-se logo um com a certidão de nascimento para
alegria dos papás e alívio do rebento. Ao Dr. Gago,
que para Ministro da República já sabíamos de outros
governos que não serve, eu recomendo-o para instrutor
da Brigada de Minas e Armadilhas, já que é perito em
desactivar bombáticas, nem que seja à custa de manter
no activo um bando de malfeitores que prejudicou e
continuará a prejudicar os incautos que lá se
matricularem.

Alentejano
Prf.,candidate-se a Ministro da Educação,e resolva os
problemas.Isto de ser "treinador" de bancada,é muito
bonito,mas resolver ,ou seja Governar,já é mais
complicado,não concorda.

Ana Fontes
O LL,desculpe,ou não percebe nada ou é parvo. Até
parece,que este Governo,é que tem culpa de tudo.Então
e os anteriores?E os cursos,que se tiraram nos anos a
seguir a 1974? Quem autorizou a Uni e outras? Quem tem
telhados de vidro,devia estar calado.Ao menos,leiam o
artigo,bem lido. Sinceramente.

Rui Baptista (ruivbaptista@sapo.pt)
A degradação do ensino superior começou com o 25 de
Abril, e continuou por aí adiante. Começou por se
transformar do dia para a noite cursos médios em
cursos superiores politécnicos. A princípio, com a
duração de 2 anos, depois de 3 anos e o grau de
bacharel, bem, depois, 4 anos e licenciatura. Agora
com a atribuição do mestrado! Fui, desde o início, um
crítico a pregar aos peixes, do ensino politécnico no
que se reporta à formação dos professores para o 1.º e
2.º ciclos do ensino básico, em que, por exemplo, um
professor licenciado pela universidade e um outro pelo
ensino politécnico só por este ter mais um valor de
formatura do que aquele lhe passa à frente nos
respectivos concursos para a docência do 2.º ciclo. De
supetão, surgem escolas superiores universitárias e
politécnicas privadas em que o ensino se transformou
numa espécie de padaria que distribui pão mal cozido
que sacia a fome de ignorantes com bolsas bem
recheadas. Em tempos mais recentes, surgiu o Processo
de Bolonha para degradar as licenciaturas
universitárias obtidas em anterioridade. No
estrangeiro ao 1.º ciclo de estudos superiores deu-se
o nome de bacharelato. Em Portugal de
licenciatura!...Mas onde o arrojo atinge proporções de
verdadeiro escândalo é o facto da Universidade
Independente ter admitido alunos sem o 12.º ano,
obrigando-se a obtê-lo no decurso do curso. Para mais,
"houve falsificação de diplomas do 12.º, ou
equivalente, para ingresso na Universidade
Independente", Mariano Gago, "dixit"! Rui Baptista
(Coimbra) CONTINUA!

Um engenheiro de ... RVCC
26 ministros depois... o que queria... desta veloz
democracia...espere pelos frutos da Novas
Oportunidades... que a procissão ainda vai no adro.

Rui Baptista (ruivbaptista@sapo.pt)
CONTINUAÇÃO Mas onde este "statu quo" atinge
verdadeiro escândalo é no que se refere ao Decreto-Lei
64/2006, de 21 de Março (obviamente, publicado antes
de rebentar o escândalo da Universidade Independente),
que estipula o acesso ao ensino superior
"independentemente das habilitações académicas". Quer
isto dizer, segundo a letra da lei, que o 1.º ciclo do
ensino básico "quantum satis" para o efeito! Estas
provas de acesso que se podem classificar de pontapé
no fundo das costas e já estás lá dentro, são elas
elaboradas pelo próprio estabelecimento de ensino e
classificadas por professores da casa!...Oportunidade
caída dos céus aos trambolhões, para possíveis
deputados sem o 12.ºano que encontraram aqui um
verdadeiro Cabo das Tormentas. Agora ele transposto há
que ir em frente com mar calmo e ventos de feição com
as velas enfunadas para uma universidade privada. O
pior já foi ultrapassado: não é que maganão do 12.º
ano era mesmo difícil? Porque ficaram surdos, os
vários ministros do Ensino Superior, às palavras do
Prof. Isidro Alves, antigo Reitor da Universidade
Católica, com mais de uma década? Recordo-as: "O poder
político não conseguiu programar o sistema, foi ao
sabor das ondas e, assim, resolveu problemas, em vez
de programar politicamente um sistema!". Prof. Manuel
Gonçalves da Silva, vai-me desculpar! Mas o facto de
haver uma faculdade pública de Engenharia que dispensa
os candidatos à sua frequência da disciplina de Física
do 12.º ano, é uma ligeira brisa no facilitismo que
reina no ensino superior nacional perante o verdadeiro
tsunami que sobre ele se abateu e virá a causar
prejuízos incalculáveis num futuro não muito distante
com candidatos a "Engenharia" recrutados de entre
indivíduos que demonstrem serem capazes de alinhar uns
tantos tijolos em cima dos outros e saibam contar até
100!... Rui Baptista (Coimbra)

Canudos
O drama dos canudos no país dos mesmos! Mas não há
drama nenhum! Os melhores trabalham como escravos, os
que tem um nome de família dirigem, sabe Deus como, os
que tem cunhas desenrascam-se (se não estorvarem já é
uma sorte) e os outros vão trabalhar como
trabalhadores indiferenciados. Quando quiserem
inquirir porque nada funciona já não há empresas para
estudar o fenómeno. Estes defeitos não são de esquerda
nem de direita são portugueses! Todos sabemos e todos
aceitamos! Como hoje é dia do trabalhador aqui vai a
minha saudação para os que com ou sem canudo trabalham
para pagar esta pesada factura.

LL
Claro que a desculpo, cara Ana Fontes! Desculpo-a pelo
insulto gratuito, que não é norma neste forum, como
também a desculpo por me ofender baseada em opiniões
que não escrevi: onde é que eu disse que a culpa é
somente deste governo? Que eu saiba o eduquês e a
democratização do ensino feita sem controlo de
qualidade é culpa de todos os governos. Todos,
incluindo este! Que vai deixar pior o que recebeu mau
no ensino superior. O que se pede ao Ministro da
tutela é que corrija o que está mal (o que Mariano
Gago objectivamente não faz) e não tente destruir o
que se está a fazer bem (como o tristemente célebre
acordo com o MIT). Agora lembrou-se de ter uma entrada
de leão com a ameaça de encerramento da Independente.
Vamos a ver se a saída não é de sendeiro pelos rabos
de palha do PM...

Tanta guerra meu Deus...
Foi necessário aparecer um Primeiro Ministro capaz de
reunir uma equipe e apresentar resultados para se
desencadear esta guerra de diplomas. Mais uma vez o
importante para este país são os diplomas e não as
reais capacidades de trabalho dos portugueses.
Estávamos todos distraídos, acordamos e eis que
descobrimos que estamos em Portugal. Entretanto o
Mundo vai rodando, Bill Gates é o homem mais rico do
mundo sem licenciatura nenhuma e Albert Einstein teria
reprovado no 12º ano se nascesse em Portugal. Peço ao
LL e Ana Fontes que se não zanguem!

G. Silva (mgs@fct.unl.pt)
Não sei se me é legítimo comentar os comentários, mas
gostaria de concordar com o tsunami do Rui Baptista.
Há muitos problemas, mas os maiores resultam da
passividade académica e da sua falta de interesse
pelas questões que não afectem cada um no imediato e
na proximidade. Bolonha vai mal, mas as Universidades
são grandes responsáveis porque nada fizeram, em
tempo, para tentar que fosse bem. Os pareceres são
indigentes porque quem os subscreve é míope
intelectual e esquece que há diversidade no Ensino e
não só aquilo que ensina. E, acima de tudo, há a
incapacidade orgulhosa de corrigir erros evidentes
(ainda que cometidos, quem sabe?, "por bem fazer"),
aliada ao tal "scratch my back" tornaram os dirigentes
e as instituições em repositórios de incompetência e
hipocrisia. Ou alguém acredita que o Ministro e
Ministérios não sabiam (não sabem) como funcionam a
maior parte dos cursos das privadas? Ou aceita que os
critérios de registo de cursos integrados de
engenharia pela Direcção Geral são aplicados com
isenção? Acredito que não.

Rui Baptista (ruivbaptista@sapo.pt)
Agradeço ao Prof. Gonçalves da Silva o comentário ao
meu comentário. Fi-lo por considerar o seu artigo de
um grande interesse e digno de ser meditado. Enviei
ontem, dia 2 de Maio, um artigo de opinião para o
"Diário de Coimbra", de que sou colaborador, em que
referencio o seu artigo: "O ensino do nosso
descontentamento". Título bem escolhido, pois o ensino
superior actual só pode ser, na verdade, o "nosso"
descontentamento. O descontentamento de todos aqueles
que assistem, lutando até à exaustão, como o Professor
(e eu dentro das minhas fracas possibilidades, de há
décadas a esta parte) para que das suas cinzas possa
renascer uma renovada Félix: um ensino superior
(porque o é na realidade!) e não um ensino degradado
até às fronteiras da indignidade e por elas fazendo
incursões à luz do dia ou pela calada da noite! Razão
assistiu ao falecido Francisco Sousa Tavares quando
escreveu: antes de 25 de Abril Portugal era um país de
analfabetos, hoje é um país de burros diplomados!

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