quinta-feira, janeiro 29, 2009

Avaliar professores ou mera empreitada administrativa?

(recebido por mail):

Este é um artigo do Prof. João Ruivo que foi Vice-Presidente do

Instituto Politécnico de Castelo Branco...onde o outro "senhor" foi
Presidente do mesmo Instituto e ocupa agora o cargo de Secretário de
Estado da Educação.

É uma das análises mais completas e lúcidas que li sobre o tema.

Avaliar professores é fácil?

Editorial



Não! A avaliação de professores não é uma tarefa simples. Que o digam
os supervisores que, durante décadas, promoveram a formação inicial e
permanente dos nossos docentes. Para avaliar professores requerem-se
características pessoais e profissionais especiais, para além de uma
formação especializada e de centenas de horas de treino, dedicadas à
observação de classes e ao registo e interpretação dos incidentes
críticos aí prognosticados.
Cuidado com as ratoeiras! Quem foi preparado para avaliar alunos não
está, apenas pelo exercício dessa função, automaticamente preparado
para avaliar os seus colegas...
A avaliação de professores é uma tarefa complexa. Desde logo, requer
um perfil específico do avaliador. Ou seja, nem todos os professores
reúnem as condições para avaliarem. O avaliador terá que ser uma
pessoa com conhecimentos especializados, com enorme sensibilidade, com
capacidade analítica e de comunicação empática, com experiência de
ensino e elevada responsabilidade social. Terá que ser um profissional
que sabe prestar atenção, sabe escutar, sabe clarificar, sabe
encorajar e ajudar a encontrar soluções, sabe dar opiniões, e que sabe
ainda negociar, orientar, estabelecer critérios e assumir todo o risco
das consequências da sua acção.
É necessário que domine com rigor as técnicas de registo e de
observação de aulas, conheça as metodologias de treino de
competências, os procedimentos de planeamento curricular, e as
estratégias de promoção da reflexão crítica sobre o trabalho
efectuado.
Escolher um avaliador obriga a uma selecção aturada, fundamentada,
baseada em critérios de indiscutível mérito e, depois, a uma demorada
formação específica e especializada. Para que uma avaliação tenha
consequências, o avaliado não pode ter quaisquer dúvidas sobre o
mérito do avaliador.
Avaliar é uma tarefa periscópica. O avaliador é chamado a
pronunciar-se sobre inúmeros domínios sobre os quais se reflecte o
pluridimensional acto de ensinar. Quando avalia, olha o professor
sobre variadíssimos ângulos e prismas: aprecia o professor enquanto
pessoa, como membro de uma comunidade profissional, como técnico
qualificado na arte de ensinar e como especialista das matérias que
ensina.
Por outras palavras o avaliador avalia o professor em vertentes tão
diferenciadas quanto o são o seu ser, o seu saber e o seu saber fazer.
Logo, o avaliador tem que estar atento a um grande número de variáveis
que intervêm na função docente: variáveis de produto, de processo, de
presságio, de carácter pessoal e profissional...
O avaliador recolhe elementos que permitam avaliar, e depois
classificar, o professor enquanto tenta responder às seguintes
questões: Onde ensina? O que é que ele ensina? Como é que ensina? O
que aprendem os seus alunos? Como se auto avalia? Que capacidade tem
para reformular a sua actuação? Com que profundidade domina as
matérias que pretende ensinar?
O avaliador não trabalha com o professor apenas na sala de aula. Ele
tem que apreender o modo como o professor se envolve com os seus
alunos numa situação de classe, mas também como este se implica junto
da comunidade escolar e na sociedade que envolve a escola. Porque
trabalha com ele como profissional, mas também enquanto pessoa.
Formar um avaliador leva tempo, elevadas doses de paciência, muito
treino e conhecimento especializado. A escolha de um avaliador não
pode ser casual e, sobretudo, não pode depender de critérios político
administrativos.
Porquê? Porque o avaliador tem que saber verificar não só o que os
professores fazem, mas também como o fazem e, simultaneamente,
garantir a melhoria da qualidade da sua intervenção na sala de aula,
bem como a qualidade do produto, isto é, da aprendizagem dos alunos.
Por isso mesmo a avaliação de um professor não pode ser uma actividade
episódica, pontual e descontinuada. A avaliação de um professor requer
uma actividade continuada, porque importam mais as actividades de
reformulação que venham a ser consideradas do que o simples
diagnóstico da sua actual situação. A avaliação de um professor é
então uma actividade projectada no futuro.
Avaliar um professor é, pois, dizíamos, uma tarefa muito, mesmo muito
complexa. Simples, muito simples mesmo, é avaliar um ministro que
pensa ser possível reduzir a avaliação dum professor a uma mera
empreitada administrativa, compilada em duas páginas de panegíricos ou
de recriminações.

João Ruivo
ruivo@rvj.pt
http://www.ensino.eu/home.html

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