quinta-feira, abril 24, 2008

Análise do "Memorando do Entendimento" ponto por ponto


O “Memorando de Entendimento”

assinado entre a Plataforma Sindical dos Professores e o ME

a 17 de Abril de 2008

Análise, ponto por ponto, efectuada por Carmelinda Pereira e Joaquim Pagarete – membros da Comissão de Defesa da Escola Pública (CDEP)

Texto do Memorando

A nossa apreciação

1. No respeitante à avaliação dos docentes, os procedimentos a adoptar no ano lectivo 2007/2008 serão os seguintes:

a) Prosseguimento e desenvolvimento do trabalho considerado necessário pelas escolas;

b) Aplicação de um procedimento simplificado nas situações em que seja necessária a atribuição de uma classificação por estar em causa a renovação ou a celebração de um novo contrato, ou ainda a progressão na carreira durante o presente ano escolar;

c) Relativamente aos docentes integrados na carreira não considerados na alínea anterior, e que serão classificados apenas em 2008/2009, deverá proceder-se à recolha de todos os elementos constantes dos registos administrativos da escola;

d) Os elementos obrigatórios do procedimento simplificado referido na alínea b) são os seguintes: ficha de autoavaliação e parâmetros relativos a nível de assiduidade e cumprimento do serviço distribuído; participação em acções de formação contínua, quando obrigatória e desde que existisse oferta financiada nos termos legais.

e) Para efeitos de classificação, quando esta tenha lugar em 2007/2008, apenas devem ser considerados os elementos previstos na alínea anterior.

1. O trabalho de organização dos procedimentos da avaliação – de acordo com as alínea a) e c) – vai continuar a ser feito como está determinado no Dec. regulamentar 2/2008, de 10 de Janeiro, sobre a Avaliação do Desempenho Docente, para que a avaliação nestes moldes seja aplicada a partir de Setembro de 2008.

b) Esta alínea corresponde a um recuo temporário do ME, que sempre disse que os professores contratados teriam que ser avaliados, mesmo que de forma “simplificada”, mas deixando o conteúdo dessa forma a cada Conselho Executivo, o que se estava a traduzir no caos nas escolas, com cada Executivo a fazer como entendia, incluindo a aplicação completa dos parâmetros contidos na Lei.

Este recuo – que deverá traduzir-se numa avaliação uniforme para todos os docentes a avaliar até ao final deste ano lectivo, segundo a alínea d) – é o resultado da mobilização dos professores, expressando a rejeição completa do novo sistema de avaliação do ME.

Foram as “grelhas” impostas pelo ME, baseadas em parâmetros arbitrários e injustos – como, por exemplo, as notas e a assiduidade dos alunos –, bem como os seus procedimentos e quotas, impossíveis de aplicar ou inexequíveis, no dizer de muitos professores que as estudaram exaustivamente, que conduziram à explosão generalizada dos professores, culminando na manifestação nacional de 8 de Março.

Houve um adiamento, mas o que os professores querem é a revogação definitiva deste decreto.

2. No primeiro ciclo de aplicação do regime de avaliação de desempenho do pessoal docente, que será concluído no final do ano de 2009, abrangendo todos os docentes, serão reforçadas as garantias dos avaliados, nos seguintes termos:

a) Serão instituídas normas que garantam que a produção dos efeitos negativos da atribuição das classificações de Regular ou Insuficiente estará condicionada ao resultado de uma avaliação a realizar no ano seguinte, não se concretizando, caso a classificação nessa avaliação seja, no mínimo, de Bom. Por essa razão, os constrangimentos decorrentes da atribuição de uma classificação de Insuficiente à celebração de novo contrato, no final deste ano lectivo, não produzirão efeitos, excepto quando se trate de renovação. No caso da atribuição de classificação de Regular:

i) aplicar-se-ão, para efeitos de renovação, as regras que vigoraram em 2006/2007, designadamente que se mantenha a existência de horário lectivo completo e exista concordância expressa da escola.

ii) será considerado o tempo para os efeitos previstos no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro.

b) Os efeitos dessa segunda classificação, nesses casos, prevalecem sobre os que decorreriam da primeira, substituindo-a, ficando garantida a recuperação do tempo de serviço coberto pela anterior avaliação;

c) Mantêm-se os efeitos imediatos da avaliação quando permitam a progressão em ritmo normal ou quaisquer outros previstos no Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro.

2. O ME renuncia ao despedimento imediato dos contratados, o que constitui um elemento positivo, embora impondo como condição que haja horário e que o director da Escola queira lá esses contratados – ficando estes sujeitos a um recrutamento arbitrário e subjectivo.

Mas, nós recordamos que a importância do trabalho docente, exigindo uma liberdade pedagógica responsável, não se coaduna com o facto de um professor saber – à partida – que essa prática está dependente da apreciação de um director que pode dizer, no final do ano, se o quer ou não escola.

A importância das funções docentes exige que todos os professores possam ser vinculados.

3. Aplicação, aos professores contratados por menos de quatro meses, a seu pedido, do disposto n.º 2 do artigo 28.º, do Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de 10 de Janeiro, e, consequentemente, contabilização do tempo de serviço para efeitos de integração e progressão na carreira docente.

3. É mais do que justo que todo este contrato parcial seja considerado e contabilizado para efeitos de tempo de serviço do docente, quando este ficar integrado na carreira, com um vínculo ao Estado, a partir de um concurso nacional, como o reivindicam todos os docentes. Trata-se de garantir o funcionamento de uma escola democrática e nacional – a Escola da República.

4. Com o objectivo de garantir o acompanhamento, pelas associações sindicais representativas do pessoal docente, do regime de avaliação de desempenho dos Professores, proceder-se-á até ao final de Abril à constituição de uma comissão paritária com a administração educativa, que terá acesso a todos os documentos de reflexão e avaliação do modelo que venham a ser produzidos pelas escolas e pelo Conselho Científico da Avaliação de Professores.

Compete a esta comissão paritária, tendo em sua posse a documentação referida e outra que considere adequada, preparar a negociação das alterações a introduzir ao modelo de avaliação.

Estabelecer-se-ão as regras que permitam a participação ou audição de peritos indicados pelas associações representativas do pessoal docente em reuniões do Conselho Científico da Avaliação de Professores, a sua solicitação ou a convite da sua presidente.

4.

A) Em princípio, pode considerar-se positivo a existência de uma Comissão Paritária para observar a aplicação do Decreto da avaliação docente. Mas, neste caso, esta observação pressupõe a existência de regras claras e justas na aplicação do mesmo.

Não é este o caso, pois são os docentes – que têm estado a estudar a sua aplicação, de forma responsável, por ordem superior e a partir de cada escola – que afirmam ser a mesma inexequível, permitindo a parcialidade e a injustiça.

B) Há quem interprete esta cláusula do Memorando como sendo o reconhecimento pelo ME de que se trata da experimentação do modelo, já que – no final do ano lectivo de 2008-2009 – a Comissão Paritária poderá negociar “eventuais alterações”, além de que os docentes que tiverem negativa nesta avaliação poderão sujeitar-se a outra, no ano lectivo seguinte, e será a nota desse ano que será reconhecida.

C) A própria filosofia deste decreto ligada com a autonomia do Director (de acordo com a nova gestão escolar) permitirá as maiores parcialidades, gerando um clima relacional nas escolas muito pesado, como os docentes já estão a sentir.

Como poderá a Comissão Paritária monitorizar esta aplicação sem a existência de docentes que a representem no terreno?

A existirem esses docentes – tendo já todos tanto trabalho – como irão assumir mais esta tarefa?

Em qualquer caso, as organizações sindicais integrando-se na Comissão Paritária, deverão salvaguardar a sua independência, recusando-se a assumir qualquer tarefa de ajuda a aplicar o modelo de gestão rejeitado pelos docentes.

D) Caso contrário, será o ME a dizer que o seu modelo foi aplicado com a ajuda dos sindicatos.

5. Durante meses Junho e Julho de 2009 terá lugar um processo negocial com as organizações sindicais, com vista à introdução de eventuais modificações ou alterações, que tomará em consideração a avaliação do modelo, os elementos obtidos até então no processo de acompanhamento, avaliação e monitorização de primeiro ciclo de aplicação, bem como as propostas sindicais.

5. A exigência, afirmada por todos os professores nas reuniões do dia D e na manifestação dos 100 mil é a da retirada do próprio decreto, baseado em quotas (que, à partida, definem que só 1/3 dos professores pode aceder ao topo da carreira) e em parâmetros cujas variáveis um docente não pode controlar (como é o caso do abando e do insucesso escolares, resultantes da falta de aplicação e de disciplina dos alunos) e, ainda, os docentes serem avaliados por outros de uma área ou formação diferentes e, por vezes, mesmo de qualificação inferior.

6. Negociação, no âmbito do normativo sobre organização do ano lectivo 2008/2009, de critérios para a definição de um crédito de horas destinado à concretização da avaliação de desempenho dos professores, das condições de horário e remunerações dos membros das direcções executivas e dos coordenadores dos departamentos curriculares e ainda da abertura dos concursos para o recrutamento de professores titulares.

6. Os professores titulares – nomeados para proceder à avaliação dos colegas – acumulam com o exercício das funções lectivas. O de que todos se queixam é que o tempo que deviam utilizar para preparar aquilo que é a sua verdadeira função – ensinar e ajudar os seus alunos a construir o seu próprio conhecimento e avaliar a sua progressão – é completamente absorvido pelas tarefas de avaliação que não escolheram e para as quais são nomeados.

Como se quantifica, dentro das 35 horas semanais, o tempo para as seguintes tarefas: dar aulas, preparar as aulas, formação, avaliação e reuniões?

Sobre a abertura de concurso para o recrutamento de professores titulares, é necessário notar que a exigência mais profundamente assumida, por todos os professores com os seus sindicatos – desde que o novo ECD foi anunciado como projecto, e mesmo depois de imposto pelo ME – foi a de “uma só categoria”, como existe nos Açores e na Madeira.

7. Definição, já para aplicação no próximo ano lectivo, de um número de horas da componente não lectiva que não são registadas no horário de trabalho dos professores, compreendendo o tempo para trabalho individual e o tempo para reuniões. Essa definição deverá ter em conta o número de alunos, turmas e níveis atribuídos, não podendo ser inferior a 8 horas para os docentes da educação pré-escolar e 1.º ciclo do ensino básico e para os outros ciclos do ensino básico e ensino secundário, 10 horas para os docentes com menos de 100 alunos e 11 horas para os docentes com 100 ou mais alunos.

7. O trabalho individual destina-se à preparação das aulas, dos planos de trabalho, dos projectos de turma e dos projectos individuais dos alunos, tendo em conta a necessidade de organizar propostas diferenciadas – de acordo com os diferentes níveis de aprendizagem existentes numa turma, quando não mesmo crianças com necessidades educativas especiais – bem como o relatório de avaliação de todo este trabalho.

Normalmente, só o tempo gasto nas aulas em directo e na sua preparação ultrapassa largamente as 35 horas oficialmente reconhecida como horário de trabalho de um funcionário público.

Por esta razão os professores sempre têm afirmado que o aumento do horário na componente de estabelecimento escolar – quer para as aulas de substituição (no caso dos 2º e 3º ciclos e no secundário), quer nas de acompanhamento ao estudo e de supervisão (no 1º ciclo) – se tornam numa sobrecarga de várias horas extraordinárias. Essas horas extra impedem a realização de um trabalho docente responsável e de qualidade, do qual os professores não podem abdicar, ao mesmo tempo que os coloca numa situação de angústia, tal como de exaustão física e psíquica, para além dos prejuízos que daí resultam para a sua vida familiar.

Os professores defendem o fim das aulas de substituição, do acompanhamento ao estudo e da supervisão, para poderem cumprir o seu trabalho docente de forma racional.

8. Em cumprimento do disposto na alínea d) do n.º 3 do artigo 82.º do Estatuto da Carreira Docente, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro, o tempo para a formação contínua obrigatória ou devidamente autorizada em áreas científico-didácticas com ligação à matéria curricular leccionada ou relacionada com necessidades definidas pela escola, incluir-se-á na componente não lectiva de estabelecimento do horário de trabalho dos docentes, sendo deduzido à mesma durante o ano escolar a que respeita.

8. Considera-se positiva esta integração da formação contínua na componente do horário não lectivo de estabelecimento.

Pela expressão “sendo deduzido à mesma durante o ano escolar a que respeita”, deve entender-se que as horas de formação que um docente tenha realizado, fora do horário normal da escola – por razões que lhe sejam impostas (como, por exemplo, formações realizadas ao sábado) – que as mesmas são descontadas no respectivo horário de estabelecimento?

A natureza do trabalho de um professor ou educador exige que este não pare de estudar, participando em acções de formação variadas, cujo calendário pode coincidir com o horário de trabalho lectivo. É o caso de congressos científicos, seminários ou círculos de estudos promovidos por instituições ligadas às áreas do docente em causa.

Os professores e educadores nunca deixaram de exigir o direito a dispor de tempos próprios para esta formação, como estava definido no ECD (antes de ser revisto), e de acordo com a Lei de Bases do Sistema Educativo, no seu artigo 35º-4.

O repor deste direito – intimamente ligado à profissão docente – torna-se uma exigência premente, em contradição com o actual ECD, que obriga a formação contínua a ser feita em horário pós-laboral, salvo formações de reconhecido interesse para toda a comunidade escolar e superiormente autorizadas.

9. Na sequência da criação de mais um escalão no topo da carreira técnica superior da Administração Pública, e com o objectivo de manter a paridade da carreira docente com aquela, é criado um escalão no topo da carreira dos professores e educadores, cujo índice remuneratório corresponderá ao escalão mais elevado da carreira técnica superior. Nesse sentido, o Ministério da Educação compromete-se, a realizar até 31 de Dezembro de 2008, as negociações que respeitarão à criação desse escalão, dependendo a progressão a esse escalão do tempo de serviço prestado e da avaliação de desempenho. No que respeita à componente "tempo de serviço", esse escalão não implicará o aumento da actual duração da carreira.

9. É positiva a manutenção da paridade da carreira docente com a carreira de técnico superior da Função Pública.

Mas os professores não deixam de exigir que, à partida, todos estejam em condições de aceder a esse topo, mediante progressão decorrente de uma avaliação justa e formativa.

Caso contrário – se for mantida a carreira dividida em duas categorias e uma avaliação assente em quotas – apenas 1/3 dos professores, no máximo, teria direito a aceder a este escalão.

10. O prazo para aplicação do primeiro procedimento decorrente do novo regime de autonomia, gestão e administração das escolas pode estender-se até 30 de Setembro de 2008.

10. Os professores defenderam – a uma só voz – a gestão democrática das suas escolas, como condição para o exercício de um trabalho baseado em equipas multidisciplinares, capazes de trabalhar num quadro de partilha e de cooperação, para responder aos desafios que se colocam hoje a todas as escolas.

A avaliação externa feita à gestão democrática das escolas tem sido positiva, na esmagadora maioria das escolas.

Os professores exigem a revogação deste decreto-lei.

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