Carta pessoal ao MUP, MEP, APEDE, PROMOVA, CDEP
Companheiros/as,
Estive a pensar nos resultados concretos da nossa reunião de ontem, 1º de Abril, com membros da plataforma.
Contrariamente ao que um dirigente sindical de Coimbra (Fenprof) que dizia sobre os iluminados que aparecem com soluções magicadas numa noite de insónia, eu não sou um iluminado, não tive ontem insónia, porém venho dizer-vos o que penso acerca do que se passou e do significa para nós todos.
Eu acho que os dirigentes sindicais da plataforma estão enredados na impossibilidade de avançarem com uma mobilização, apesar de saberem que ela é imprescindível para que o 3º período não seja um momento de refluxo e portanto de «triunfo» do ME sobre as nossas cabeças e significando a destruição da escola pública.
É preciso explicar, desde já, que eles têm a maior parte da responsabilidade pelo que se está a passar, embora nós todos/as (por acção e omissão) devemos aceitar a nossa quota-parte de responsabilidade. Com efeito, as organizações sindicais têm-se acantonado ao longo dos anos funcionamento como «lóbi» ou grupo de pressão junto do poder, mas não como organizadores dos trabalhadores e das suas lutas no interior das escolas. Para isso muito concorre a incultura sindical do povo português, que não poupa -evidentemente- o professorado. É notória a falta de actividade dos núcleos locais dos sindicatos constituídos, a ausência de reuniões desses núcleos, a inexistência ou a inércia dos quadros intermédios, os delegados sindicais, que, teoricamente, seriam destinados a desempenhar importante papel no interior dos estabelecimentos, como também deveriam de ser decisivos para o processo de tomada de decisão no interior das estruturas sindicais respectivas.
É por demais preocupante a insistência num modelo de luta corporativista, desligado ou mesmo partindo do princípio que nada há a esperar do resto do povo e dos trabalhadores organizados nos seus sindicatos. É preocupante e tem que ver com uma visão elitista (e vanguardista) arreigada, que não tem sido desmontada convenientemente e portanto continua a permear o discurso sindical docente típico.
Vamos, então, ao sumo da questão:
Avizinha-se uma semana de «consultas» nas escolas. O que é que vai ser discutido nessa semana? A reunião deixou-me entrever o cenário pior possível. Os sindicatos da plataforma virão com uma proposta cozinhada, onde tudo está previsto, restando aos «simples» docentes dizer que «sim». E em que consistirá essa proposta? Pelo que eu ouvi da boca dos máximos responsáveis sindicais presentes, seria a tal manif. de dia 16 de Maio e, no final do ano, entrega da auto-avaliação e, paralelamente, de um relatório crítico sobre tudo o que se tem estado a passar no ensino, havendo ideia de produzir um texto-tipo (!!!) que os professores iriam juntar como «apenso» ao referido relatório crítico.
A estas ideias (ou antes, falta delas, pois são lamentáveis!), junta-se a recusa por alguns (sindicato da UGT) de considerar-se sequer a hipótese de greve às avaliações, por considerar-se que isso faria a população virar-se contra nós.
Então, em cima da mesa das reuniões de 20 a 24 de Abril, ficaria em discussão o quê?
As pessoas viram como a proposta, exposta pelo Joaquim (CDEP) e aprovada em 14 de Março em Leiria, foi menorizada pelo A. Avelãs: segundo ele, ela não faria sentido.
Assim, estaríamos perante uma «consulta» não no sentido de «democracia directa OU PARTICIPATIVA» mas sim no sentido de uma consulta do médico à cabeceira do doente!!!
Com efeito, se nós não aproveitarmos a oportunidade de fazer das jornadas de 20 a 24 de Abril ocasião da mais vasta e aprofundada reflexão sobre o Estado da Educação no nosso país, em particular, dos problemas que este governo tem causado ao nosso sector, uma espécia de ESTADOS GERAIS DA EDUCAÇÃO, teremos perdido definitivamente a iniciativa, teremos nada para contrapôr à ofensiva brutal e ao mesmo tempo «inteligente» (na verdade, perversa) do poder contra a ESCOLA PÚBLICA. Porque, não tenhamos dúvida que esta ofensiva não se dirige principalmente a nós, como agentes do ensino, mesmo sendo os direitos e estatuto dos professores um importante «dano colateral» desta guerra. É preciso compreender que esta guerra tem como objectivo mercantilizar e tornar completamente dócil a essa mercantilização a escola e seus agentes: a escola, está sendo transformada num imenso mercado, cheio de oportunidades para os «empreendedores» e onde os autarcas e políticos de toda a espécie irão mergulhar, predando os lugares de chefia, cada vez mais apetitosos em termos de poder real e de remuneração. Nisto, o povo trabalhador, cujos filhos frequentam a escola pública, só tem a perder. A escola que irão (des)construir será uma escola totalmente servil ao capitalismo, politizada no pior sentido (ou seja transformada em local de tráfico de influências pessoais e políticas), sem quaisquer perspectivas de funcionar como «elevador de classes sociais» mas, pelo contrário, mantendo e reforçando a estrutura classista e o fosso entre ricos e pobres ( que, como sabeis, é dos mais elevados neste país comparativamente com os outros da OCDE).
Pelo menos a proposta da CDEP tem o mérito de contextualizar a nossa luta, de dar oportunidade a demonstrar à cidadania e ao eleitorado que este governo, contrariamente á propaganda, não está a acrescentar, mas desestabilizar; não está a construir, mas a destruir; não está a qualificar, mas a abastardar; não está a reformar, mas a desmontar tudo o que foi construído de melhor em 35 anos de democracia política, no que respeita ao sistema público de educação. Tudo isto no desrespeito mais absoluto de leis, leis essas produzidas e votadas pelo PS no poder ou pelos seus imediatos antecessores.
A incapacidade dos professores fazerem passar a ideia tão simples de que a escola está a ser atacada, não sendo a nossa luta uma luta corporativa, embora haja razões legítimas que nos assistem ao defendermos o nosso estatuto, etc. tem que ver com uma visão política estreita e ultrapassada que é veiculada por certos dirigentes sindicais. Eles consideram-se os que «pensam» as coisas e os «braços e pernas», «a classe», «as massas», terão de aceitar deixar cair os braços (chamam a isso greve) ou marchar como exército de carneiros (CHAMAM A ISSO MANIF).
De facto, eles arriscam-se a ter o esquema furado, pelo facto de haver esquerdistas dispostos a tudo para furar esta modorra, para acabar de vez com as direcções sindicais vendidas e traidoras, que apenas «picam o ponto» em vez de organizar a luta. Eles irão dar tudo por tudo para conseguir fazer com que, pelo menos em certos locais seja votada a greve em assembleia de docentes.
Eu, pessoalmente, acho que a estratégia de avançar para greves localizadas, possível em assembleias de escola (galvanizadas por activistas mais ou menos habéis e convencidas de que assim teriam a hipótese de arrastar o conjunto do professorado para uma greve de grandes dimensões) é completamente irrealista. Caso não fosse, eu seria um proponente de tal estratégia.
Mas não vejo que ela traga qualquer benefício em termos de nossa luta concreta, da possibilidade de colocar em cheque o poder e de nos posicionarmos melhor, nesta guerra de desgaste.
Com efeito, a desmobilização da imensa maioria dos docentes foi causada pela direcção marcadamente titubeante e reformista destas lutas, quando tinha a plataforma a iniciativa perdeu-a, tendo sido reiteradamente dada a oportunidade ao movimento sindical docente de fazer frente ao governo, sabendo nós que os movimentos, nisso, tiveram um enorme papel. Agora, o melhor que podemos fazer é limitar os estragos, impedir que os esforços de mais de um ano intenso de luta seja completamente desperdiçado (ou pior, canalizado para A CHICANA POLÍTICA ELEITORAL).
O que proponho é que façamos uma manifestação, cívica, não com os pés (somente), mas (sobretudo) com os cérebros! Não digo que não se faça uma marcha, digo sim que se faça SOBRETUDO, jornadas de reflexão e acção em torno da defesa da escola e da profissão deste país. Teriam de ser dinamizadas por nós, aproveitando as reuniões sindicais, as quais irão ser formatadas da pior maneira, como já vimos no ano anterior com o famoso «dia D» (em que as propostas já estavam pré-digeridas, apenas restando aos «estúpidos» dos professores votar nas ilustres propostas que os sindicatos iluminados nos fizeram o favor de oferecer... que lindas propostas, lembram-se? eu próprio deixei-me enganar nesse tal dia, confesso!).
Aguardo vossa crítica a um desabafo, que apenas me compromete a mim, embora considere que estamos todos coniventes nesta guerra e portanto devemos nos apoiar mutuamente e fazer unidade, construída desde a base, numa discussão séria e não à espera que os burocratas sindicais, partidários, os «opinion makers» ou «spin-doctors», façam os seus joguinhos nas nossas costas e com as nefastas consequências que estão à vista.
Solidariedade,
Manuel Baptista
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