quarta-feira, abril 08, 2009
Magalhães...
Hoje trago aqui algumas dúvidas na esperança de que alguém me possa elucidar.
A propósito da inscrição dos alunos para que possam receber o computador Magalhães, foi-nos informado de que já estavam disponíveis para a nossa escola os códigos/vouchers de acesso via internet.
Foi-nos dito que ao inscrevermos os alunos temos como campo obrigatório de preenchimento o nif do próprio professor de cada turma.
Gostaria de saber se os colegas têm estado a introduzir o próprio nif e já agora qual a vossa opinião relativa a isso.
Se introduzir o nif é campo obrigatório, até que ponto os colegas, que não estão a inscrever eles mesmo a sua turma, dado que essa tarefa é feita na secretaria de alguns agrupamentos, estão ao corrente dessa situação.
Até que ponto nos podemos recusar a dar dados pessoais ao serviço da escola nesta situação que em minha opinião cada encarregado de educação é que deveria inscrever o seu próprio educando e não os professores.
Aguardo relatos de experiências de quem já tenha feito a inscrição da sua turma.
Obrigada.
in Sala dos Professores
terça-feira, março 31, 2009
Afinal há quem não goste do Magalhães!
MAGALHÃES… AGAIN
COMPUTADOR MAGALHÃES NÃO AGRADA A ESTUDANTES CABO-VERDIANOS
http://liberal.sapo.cv/index.asp?idEdicao=64&id=22793&idSeccao=520&Action=noticia
in TERRAS ALTAS: http://terrasmuialtas.blogspot.com/2009/03/magalhaes-again.html
segunda-feira, março 23, 2009
O escândalo pedagógico do Magalhães
A robotização da educação
O escândalo pedagógico do “Magalhães”
como corruptor do ensino infantil
Na época actual, o mundo da pedagogia continua mais do que nunca em busca de soluções adaptadas aos tempos. Após a onda de cientifismo que marcou o Século XIX, sobreveio uma educação dedicada ao hediondo culto da raça, algo que entre nós, durante o período totalitário fascista, encontrou expressão na famigerada “Mocidade Portuguesa” decalcada da Juventude Hitleriana da Alemanha nazi. Agora, apesar dos vastos conflitos puramente humanos que afligem a classe docente, tenta-se uma solução electrónica-totalitária: a distribuição em massa de 500.000 minicomputadores “Magalhães” para todo o ensino básico. O projecto é anunciado como uma “revolução para a educação em Portugal” e algo “sem igual no mundo”, sendo que a máquina é pomposamente apresentada como autêntica janela para o futuro e para a vida das novas gerações.
“Magalhães” é na verdade um nome fantasioso para o minicomputador “Classmate” modificado, da mega-empresa americana Intel, sendo que todo o projecto é puro plagiato da missão visionária da OLPC, uma fundação americana que pretende mudar a face da humanidade colocando um minicomputador nas mãos de cada criança do mundo. Após desligar-se da OLPC, a Intel dedicou-se à conquista de um novo mercado global potencial de proporções astronómicas: mais de um bilhão de crianças. Para isso, passou a realizar negociatas de alto nível com governos de países subdesenvolvidos, para a montagem regional da máquina sob diversos nomes e versões. Depois da Irlanda, onde a Intel desfrutou há anos de condições preferenciais para instalar a sua segunda maior fábrica de chips, Portugal foi agora estrategicamente escolhido como país praticamente terceiro-mundista, mas integrado na Europa, para assegurar a montagem, em condições rentáveis, de um minicomputador destinado à exportação em massa.
Assim, o projecto supostamente “educativo” do Magalhães em Portugal é mais exactamente uma super-manobra demonstrativa de marketing para um big business internacional. Curiosamente, esse golpe comercial vem acompanhado de factores imponderáveis: na sequência da crise económica, a Intel está assolada por uma crise global que já provocou no fim do ano passado uma queda de 90% nas suas vendas, estando prevista a eliminação de milhares de postos de trabalho e o encerramento de fábricas na Malásia, Filipinas e EUA. Enquanto isso, a Índia, um país com enormes capacidades independentes, optou por dar as costas aos potentados ocidentais e produzirá em breve em massa o seu próprio minicomputador “Sakshat” a um preço irrisório.
Entre nós o projecto suscita ainda questões de outra índole: Porque obrigar professores a realizar tarefas administrativas estranhas à profissão? O que é que um colossal projecto tecnológico-comercial tem a ver com a nossa atardada educação infantil? Não haverá limites éticos para funcionários públicos que passam a agir como virtuais promotores de vendas para a indústria? Que autoridade humanística e pedagógica tem uma empresa industrial magnata para vir instruir pais e professores quanto ao novo ensino robotizado que pretende implantar entre a infância portuguesa? Serão de admitir como legítimas as invasões da esfera familiar e infantil pela publicidade magalhânica, que já apresentou às ingénuas mentes infantis propostas como “Ganha um iPhone 3G” ou “Ganha um Nintendo DS Lite”? E surge até uma pergunta computacional: será de admitir escravizar as futuras gerações cibernéticas portuguesas, praticamente desde o berço, ao potentado bilionário da Microsoft?
No contexto da autêntica febre que se apossou do mundo computacional, conforme foi descoberto esse vastíssimo mercado infantil praticamente intocado, muitas mais questões delicadas poderiam ser formuladas. Mas o aspecto fundamental é que o lançamento do Magalhães entre nós constitui uma escandalosa experiência sem qualificação pedagógica, sendo que numerosas realidades sobre os efeitos gravíssimos para a formação das personalidades das crianças continuam desconhecidas (ou ocultadas) dos pais, professores e grande público. Entretanto, o tema já foi estudado durante décadas e em profundidade em inúmeras universidades e comunidades educativas em todo o mundo, revelando resultados assombrosos.
Mark Lawson, presidente de uma junta de educação, disse que após setes anos não havia qualquer evidência de um impacto positivo sobre o rendimento escolar, sendo que os computadores tinham provocado sobretudo uma dispersão para o processo de aprendizagem. O abandono dos computadores durante trabalhos escolares e o crescente uso abusivo para fins particulares, mais a insuficiente preparação dos professores e os enormes encargos financeiros para lidar com milhares de aparelhos, forçaram por fim os próprios professores a boicotar o seu uso. Também um estudo do Departamento Nacional de Educação dos EUA demonstrou que não havia diferença no sucesso académico entre estudantes que anteriormente usaram, ou não, programas computerizados para a aprendizagem das disciplinas mais críticas: a matemática e a leitura.
Segundo a Dra. McGregor, da University College London, as actividades lúdicas não digitais são capazes de promover o quociente de inteligência (IQ) inclusive em crianças que sofrem de malnutrição e sub-estimulação, como é o caso de milhões de crianças no terceiro mundo. Conforme a pesquisa concluíu, uma simples intervenção dos governos ao mais baixo nível, e a custos mínimos em comparação com tecnologias high-tech, poderia ter uma influência decisiva para mudar as atitudes e encorajar actividades, com imediatos resultados positivos para o rendimento escolar.
Uma pesquisa realizada entre quase 1 milhão de alunos pelos Drs. Clotfeiler, Ladd e Vigdor, da Harvard University, revelou que os melhores resultados em matemática e leitura foram alcançados por crianças que não tinham acesso a computadores
Uwe Buermann, colaborador científico do Instituto Ipsum em Stuttgart e docente de Ciências Computacionais em Kiel, sublinhou que os meios electrónicos presentes na vida de uma grande parte da população infantil são cada vez mais ingenuamente considerados pelos pais como brinquedos, tornando-se assim algo que as crianças podem usar a bel-prazer. Conforme elas mostram depois uma aparente habilidade superior à dos adultos para lidar com as aparelhagens, muitos pais e educadores ficam confortados e deixam de interessar-se pelos seus efeitos negativos, imaginando que são coisas inofensivas e infantis. Entretanto, inúmeros estudos rigorosos já atestaram que o convívio prematuro de crianças na fase pré-pubertária com computadores e tecnologias da comunicação impede de maneira notável o desenvolvimento de muitas capacidades e habilidades, sendo precisamente essas crianças que posteriormente sofrerão de uma limitação nas suas chances pessoais e profissionais, ficando dependentes para o resto da vida.
Nas escolas, cada vez mais crianças mostram debilidades do tipo Distúrbio de Hiperactividade e Défice de Atenção (DHDA). A neurobiologia já atestou que em numerosos casos trata-se de danos psicológicos e orgânicos derivados do consumo de meios electrónicos na primeira fase da infância. A frase “Os computadores ensinam as crianças a lidar com computadores” é muito popular entre os apóstolos pró-digitais, mas imaginar que isto já constitui uma preparação para a vida constitui uma ilusão bastante elementar. O que as crianças em idade pré-pubertária realmente aprendem com os computadores é a mera manipulação dos mesmos, o que não deve ser confundido com uma competência medial. Uma verdadeira competência medial exige suficiente capacidade de auto-avaliação para o uso individual de qualquer aparelhagem, mais uma criatividade bem desenvolvida, e ainda um saudável discernimento crítico acerca dos conteúdos – coisas que as crianças só alcançam mais tarde.
Na Universidade de Munique, um estudo sobre o meio-ambiente computacional familiar e escolar, realizado pelos Drs. Fuchs e Woessmann com o patrocínio da Volkswagen, concluíu que a mera presença de um computador em casa está negativamente relacionada com o rendimento escolar. A existência de computadores na escola demonstrou uma relação insignificante com o desempenho geral dos alunos, e a disponibilidade da internet na escola mostrou inicialmente algum efeito, mas o mesmo degradava-se rapidamente conforme aumentava o número de visitas internéticas por semana. O estudo veio confirmar anteriores pesquisas internacionais que já haviam determinado resultados decepcionantes para os computadores, em termos de rendimento educacional. Os autores acabaram por concluir que, onde quer que os computadores sejam aplicados para substituir outros tipos de instrução, quem sai prejudicado é o aluno.
Entre muitos pais e educadores, espalhou-se a crença de que deixar crianças em frente de um aparelho de televisão, vídeo, etc. contribuirá pelo menos para torná-las mais aptas para lidar com computadores e outros aparelhos, quando mais tarde entrarem para a escola. Os Drs. Zimmerman e Christakis, da University of Washington, atestaram pelo contrário que as populares séries de vídeos infantis estão a fazer mais mal do que bem, especialmente para crianças com dificuldades de desenvolvimento da linguagem. As crianças sofrem um efeito exactamente inverso, deixando de aprender novos vocábulos. Esse resultado negativo, mesmo quando os programas vêm apresentados como educativos, foi verificado também na Faculdade de Medicina da University of New Mexico. A interacção com o mundo real revelou-se como fundamental, sendo que as habilidades linguísticas podiam ser melhoradas até com o simples expediente das crianças ouvirem histórias lidas por adultos. Os pesquisadores emitiram uma condenação categórica: a exposição prematura de crianças a programas audiovisuais só pode produzir o aparecimento de uma geração de crianças hiper-estimuladas e posteriormente deficitárias em termos de concentração.
Um estudo clínico sobre saúde familiar, realizado na Academia Americana de Pediatria, apontou para o facto que os jogos e brincadeiras reais, não digitais, desempenham um papel essencial para a educação, contribuindo para o bem-estar cognitivo, físico, social e emocional, tanto das crianças como dos futuros jovens. Além disso, essas actividades oferecem uma oportunidade ideal para pais e filhos envolverem-se em um verdadeiro convívio humano. Infelizmente, essas actuações pedagógicas salutares vêm sendo abandonadas, devido a uma série de factores como vidas mergulhadas em stress, desintegração das famílias, e uma crescente tendência para a mera acumulação de conhecimentos e dados nas escolas. Muitos pedagogos passaram a menosprezar como factor supérfluo as actividades dos tempos livres e o seu papel essencial para a aquisição de uma série de habilidades permanentes, que são na realidade impossíveis de obter de qualquer outro modo.
Na Universidade Tufts de Massachusetts, o Dr. Elkind estudou durante muitos anos o desenvolvimento de crianças, verificando que a habilidade auto-lúdica está simplesmente a desaparecer, sob o efeito conjugado de meios electrónicos e actividades sedentárias, e ainda uma crescente pressão dos educadores para que crianças do nível básico mostrem cada vez mais rapidamente resultados de cariz académico. Para milhões de crianças, a infância passou a designar um período da vida confinado a quatro paredes. Até jardins de infância estão a ser cada vez mais transformados em verdadeiras escolinhas academificadas, onde as crianças são prematuramente tratadas como mini-adultos, sendo até submetidas a testes elementares e recebendo tarefas para casa.
Conforme o Dr. Elkind salientou, durante as últimas duas décadas as crianças perderam em média 12 horas de tempos livres por semana. Ao mesmo tempo, o período dedicado a desportos duplicou e o número de minutos dedicados a actividades passivas cresceu de 30 minutos para mais do que 3 horas por semana – isto sem contar com os intervalos para contemplar passivamente um aparelho de televisão. “Os efeitos sobre a posterior vida escolar e académica são desastrosos. Ao lidar com ciências e matemática, por exemplo, os jovens sentem-se mais tarde empobrecidos em termos de imaginação e criatividade”, comentou o Dr. Elkind. Também o Dr. Bob Marvin, na University of Virginia, salientou que décadas de pesquisas já demonstraram que as brincadeiras e as puras vivências fora das salas de aula são aquelas que colaboram mais decisivamente, durante o primeiro período de cognição infantil, para as futuras habilidades académicas adultas, e para uma competência de aprendizagem para o resto da vida.
Em 1840, após séculos de educação infantil atrelada às árduas obrigações laborais das famílias, o genial pedagogo Froebel foi o primeiro a usar a expressão “jardim” para designar locais de abrigo para crianças, reconhecendo já nessa época a importância marcante das práticas lúdicas e naturais para a formação da futura personalidade adulta. Mas nos últimos anos, sob a perspectiva cientifista do “aproveitamento estratégico da inteligência infantil”, está em curso em vários países um processo de robotização até de jardins de infância, com a instalação de potentes centros de computação disfarçados como brinquedos. Ao mesmo tempo, o mercado dos produtos para crianças, usando estratégias sem controlo ético ou educativo, veio provocar um amadurecimento prematuro das crianças, ao promover uma “compressão etária”, de modo que produtos concebidos para crianças maiores, ou até para adultos, sejam consumidos por crianças de cada vez menos idade.
No Departamento de Ciência de Computação da Universidade de São Paulo, o Dr. Valdemar Setzer vem estudando há muitos anos o tema dos Meios Electrónicos e Educação (ver o interessantíssimo livro com o mesmo título, ISBN 9788586303913). Consultado acerca do projecto Magalhães, ele declarou que semelhante medida resultará quase só inútil, ou altamente prejudicial para crianças e adolescentes. A distorção introduzida no modo de pensar, aliada aos factores mais comumente discutidos, como a perda do tempo para brincadeiras, os perigos da internet, e a falta de um auto-controlo que as crianças só alcançam mais tarde, acabam por prejudicar o rendimento escolar. Durante a última Multiconferência Mundial sobre Sistemia, Cibernética e Informática ele referiu como a totalidade do mundo educativo, a nível internacional, está hoje carente de uma profunda reforma, reforma essa que deve instituir uma intensificada humanização, e não a introdução de cada vez mais tecnologia. O tema pode ser consultado em “www.ime.usp.br/~vwsetzer/pals/palestras” que contém extenso material em língua portuguesa.
O que está em causa não é só a perda da habilidade de escrever à mão, ou a necessidade de milhões de crianças em breve terem que usar óculos para compensar a deterioração da visão. O fenómeno do uso irrestrito de meios electrónicos entre crianças na fase pré-pubertária equivale a uma verdadeira deturpação do nosso universo infantil, uma vez que os incomensuráveis danos psíquicos e orgânicos provocados a longo termo ocorrem precisamente durante os delicados primeiros passos da formação das almas infantis, prejudicando-as indelevelmente no seu desenvolvimento harmónico e saudável. Conforme o Dr. Setzer comentou com palavras rigorosas e desabridas: “Isto só poderá levar ao aparecimento de adultos anti-sociais, com ideias fixas, passivos, fanáticos e pobres em forças de compaixão e criatividade”.
Uma recolha entre todos os estudos disponíveis permite sumarizar dez efeitos que os meios electrónicos exercem sobre crianças na fase pré-pubertária: (1) Inducão de uma admiração desmesurada por máquinas, conforme o complexo funcionamento dos computadores permanece incógnito; (2) Estímulo para a ideia que máquinas dotadas de “inteligência artificial” podem em muitos casos ser mais perfeitas do que seres humanos; (3) Cultivo de uma concepção materialista do mundo, com uma visão fatalística da humanidade e da vida, do tipo “tudo é previsível e programável”; (4) Inclinação para uma estratégia de vida baseada na fé computacional de “dividir para conquistar”, ou seja, subdividir sempre um problema em partes menores, a fim de resolvê-las separadamente – o que resulta desastroso quando aplicado a seres humanos; (5) Deterioração dos valores de sociabilidade, uma vez que os computadores são usados individualmente e os contactos via internet, blogues, skype, emails, etc. permanecem sob a máscara cibernética; (6) Provocação de impulsos tendentes a realizar tudo na vida rapidamente e com variadas acções em simultâneo; (7) Debilitação das capacidades de concentração mental, contemplação e paciência; (8) Degeneração da memória e distorção da capacidade do pensamento criativo, conforme deixa de ser necessário memorizar o que é facilmente arquivável em gigantescas memórias electrónicas; (9) Incitamento à utopia de “aprender é fácil como brincar”, devido à concepção infantilóide dos softwares; (10) Eventualmente degeneração de funções neurocerebrais, devido à constante exposição a campos electromagnéticos nas proximidades da cabeça.
* * *
A título de rifão educativo, os textos de divulgação do Magalhães apresentam para pais e mães a suposta necessidade dos seus filhos serem preparados para “competências nas tecnologias de informação e comunicação” desde o mais cedo possível. Colaboradores do projecto consultados junto à Universidade de Lisboa recomendaram até o uso a partir dos 4 anos de idade. A documentação faz uma estranha inversão de valores: os adultos são apresentados como praticamente analfabetos tecnológicos, enquanto que as crianças são enaltecidas por terem qualquer coisa como uma sabedoria nata, devido a “viverem desde o nascimento cercadas por computadores, jogos de vídeo, aparelhos de música digital, câmaras e telemóveis” e terem sempre “visto na rua ou na televisão outras pessoas a utilizá-los”. Sugere-se que as crianças possuem, como se fossem seres que vêm já semi-robotizados do útero materno, uma espécie de segunda natureza instintiva que lhes confere “um grande à vontade, em particular com os computadores, sem necessitar de explicações ou livros de instruções”. Relegados assim para o papel de passivos cuidadores de proximidade, os pais são solicitados a simplesmente admirar os filhos “naquilo que eles já sabem fazer” e acompanhá-los para que “aprendam ainda mais”. E apesar de vivermos em uma era sacudida pelo desastre da crescente desagregação social e moral entre famílias, pais e filhos, o apelo absurdo contido no texto é para que os pais “estreitem a relação com os seus filhos no que diz respeito ao mundo das tecnologias”.
Pais e mães são ainda convocados a ajudarem os seus filhos para que eles “vivam em segurança no mundo digital em que nasceram”. Isto equivale a um alerta anti-terrorista cibernético, promovendo-se nas almas infantis a noção difusa de que nos subterrâneos incompreensíveis dos computadores está presente algo de misteriosamente perigoso. Entretanto, muito mais perigoso é outro aspecto raramente discutido: a segurança pessoal das próprias crianças. Conforme anunciou o Ministério da Administração Interna no seu recente Relatório Anual de Segurança Interna, o país sofre de crescentes índices de criminalidade. Não é difícil de prever que meio milhão de crianças transportando diariamente entre casa e escola um moderno computador portátil, poderão tornar-se vítimas fáceis de assaltos, inclusive com o uso de violência.
Além do profundo choque psicológico provocado por tais eventos, qual não será o drama de isolamento vivido por uma criança de pouca idade, que além de não poder mais realizar certas tarefas em casa, seguir instruções electrónicas colectivas na escola, ou participar nas folias digitais com os seus camaradas, ainda perde, conforme promete o folheto Magalhães, a sua “comunicação com o mundo”? Em outros países já foi suficientemente estudado o insidioso fenómeno de ostracismo e tensão social que surge entre “alunos equipados” e “alunos não equipados” (inclusive por decisão de pais), resultando no aparecimento de duas classes de crianças, com efeitos desmoralizantes para toda a educação. Isto vem acrescentar-se aos novos desafios do meio-ambiente escolar, onde por exemplo nas salas de aula os professores começam a enfrentar, cada vez mais, verdadeiros pequenos tiranos que não sabem conter os seus impulsos, regular as suas emoções ou reconhecer a autoridade pedagógica dos pais e da escola.
A experiência Magalhães pretende ainda que os pais pratiquem uma fiscalização sobre o uso feito pelos filhos. A realidade é que a maioria das famílias não tem tempo, nem interesse, nem conhecimentos para isso. Se as tradicionais psicodrogas da televisão e dos jogos de vídeo já não merecem qualquer censura crítica pela maior parte dos pais – são até muitas vezes bemvindas como distracção aliviadora dos nervos dos adultos – como se pode esperar que uma família se comporte de maneira diferente perante mais uma maquineta em casa? Tal como tradicionalmente acontece com cigarros e álcool, semelhante função policial, para impedir certas conexões internéticas e imêilicas imorais, etc. só poderá provocar o aparecimento de uma tensão moral adicional no seio das famílias, alimentando entre as crianças uma curiosidade natural mais exaltada para se ultrapassar obstáculos.
A documentação para alunos vem por sua vez colaborar para esvaziar o significado humano dos professores. No Guia de Instruções para Alunos, o computador apresenta-se às crianças com uma pseudo-personalidade de “Eu”, como uma entidade orgânica que fala às crianças em termos íntimos e carinhosos para pedir coisas como “Tal como tu não deitas líquidos estranhos para os teus olhos, também não os podes deitar no meu ecrã”, ou “Cuidado com a minha alimentação”. Em caso de perda, a mais grave consequência mencionada é “Ficas sem mim”, simulando o drama da morte entre adultos. Para esta encenação dedicada a conferir, já durante os primeiríssimos passos de robotização das crianças, uma face humana às máquinas, elas são até apresentadas às crédulas mentes infantis com a máscara de uma dimensão humanista ecuménica, que permite por exemplo que “tu comuniques com o mundo”.
E quando se trata do assunto para o qual a máquina foi afinal criada, não faltam rebuçados a prometer brincadeiras: “Juntos vamos trabalhar e divertir-nos imenso”, anuncia o texto. É impossível não lembrar aqui de imediato aquele triste período fascista da nossa história, onde uma ordenação totalitária e uniformizadora do nosso universo infantil também fazia bastas promessas de divertimento. O hino oficial da Mocidade Portuguesa abria exactamente com as palavras: “Lá vamos cantando e rindo!”.
Em paralelo com a vulgarização dos computadores como instrumentos úteis e necessários para as comunicações, indústria e comércio, ocorreu um fenómeno de deslumbramento das massas adultas, desejosas de aproveitar essa tecnologia nas suas vidas particulares, não só pelas legítimas vantagens de trabalho e de rápida consulta a fontes de informações, como também para navegações úteis ou inúteis na internet, mais o conforto quase autista de poder comprar coisas sem ter que encontrar pessoas, ou ir fisicamente a lojas.
O segundo fenómeno é a fascinação irracional que a nova tecnologia, esvaziada de valores e conteúdos éticos ou morais, vem provocando inclusive nos patamares administrativos mais elevados do mundo educativo. Com a escandalosa capitulação da máquina educacional estatal perante as máquinas digitais, surge agora inclusive uma dependência escravista perante ditames do mundo dos negócios. Numa perversa deformação de propósitos, a educação – que é simplesmente o futuro da humanidade – passa assim a depender de puras estratégias economicistas, nas quais técnicos cibernéticos até vêm intervir na formação de pais e professores para implementar a táctica técnico-pedagógica desejada.
Este é o momento histórico e dramático que estamos a assistir, conforme o avanço da miscigenação homem-máquina vem promover uma nova forma de tecno-totalitarismo e tecno-idolatria pintada de promessas futurísticas, obrigando educadores a desistirem da sua função humanista e formadora primordial, para tornarem-se meras peças de um sistema robótico invisível.
Apenas com os breves dados aqui apresentados, pais conscienciosos já estarão habilitados a repensar o uso pretendido para aparelhos electrónicos na educação das suas crianças em idade pré-pubertária.
Muitos pais e mães sentem-se inseguros em relação a todos os assuntos escolares, e mantêm uma posição de servilismo em assuntos educativos, devido a uma falta de consciência sobre os seus direitos primordiais. Será útil lembrar o que está lapidarmente estabelecido inclusive em dois documentos internacionais fundamentais:
– A Declaração Universal dos Direitos Humanos, co-assinada por Portugal junto à ONU, estabelece no artigo 26/3: «Aos pais pertence a prioridade do direito de escolher o género de educação a dar aos filhos».
– A Convenção de Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, co-assinada por Portugal junto ao Conselho da Europa, estabelece no artigo 2 do protocolo: «O Estado, no exercício das funções que tem de assumir no campo da educação e do ensino, respeitará o direito dos pais a assegurar aquela educação e ensino consoante as suas convicções religiosas e filosóficas».
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Autor: Prof. Raul Guerreiro
www.defesadacrianca.net
O autor concede a qualquer publicação, impressa ou digital, bem como
a indivíduos e quaisquer entidades, os direitos de reprodução deste artigo.
quarta-feira, janeiro 14, 2009
"Isto é uma fantochada" (Medina Carreira)
Medina Carreia comenta a situação do país, a propósito do Magalhães
Veja o Vídeo em:
http://www.sic.pt/online/video/informacao/Nos+Por+Ca/2009/1/istoeumafantochada.htm
segunda-feira, novembro 24, 2008
Chamem a polícia. Que eu não pago!
Governo enviou conta do Magalhães às autarquias
TIAGO RODRIGUES ALVES
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Isa Guerra
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http://marginalzambi.blogspot.
"EDUQUE OS MENINOS E NÃO SERÁ PRECISO CASTIGAR OS HOMENS"...Dizem que se leva um minuto para conhecer uma pessoa especial, uma hora para aprecia-las, um dia para ama-las, e mais do que uma vida inteira para esquece-las.
quarta-feira, novembro 12, 2008
Processo de aquisição do Magalhães: que legitimidade?
- Colectivamente em Conselho de Docentes, Conselhos Pedagógicos, nas escolas...perguntem às CE qual é a fundamentação legal que legitima esta imposição e, enquanto não obtiverem respostas, não preencherem nada. Das leituras que foram feitas e de troca de impressões com várias pessoas não encontrámos nada que obrigue os docentes a fazer isto. Seguidamente contactem o sindicato.
- Ou entreguem a minuta anexa e, seguidamente, requeiram as horas extraordinárias, conforme minuta de requerimento também anexa.
DOCUMENTOS:
Exmo Senhor
Presidente do Conselho Executivo
do Agrupamento de Escolas de……………….
Tendo sido convocada para introduzir, via internet, os dados dos meus alunos referentes à candidatura ao programa e.escolinha, informo que executarei a respectiva actividade sob protesto, uma vez que este tipo de trabalho não se enquadra nas minhas funções docentes previstas no Estatuto da Carreira Docente (DL 15/2006) e também porque me parece abusiva a utilização do meu número de contribuinte neste processo.
Comunico ainda que não assumo nenhuma responsabilidade relativa a:
- aquisição e pagamento de computadores “Magalhães”;
- aquisição e pagamento de serviço de internet;
- erros de introdução de dados via internet relativos a este processo.
Os meus cumprimentos.
…………., …… de ……………. de 2008
O (A) professor (a)
- entregar original e pedir nos Serviços Administrativos que uma cópia
seja carimbada com a indicação “recebido em …./…./
Exº Senhor
Presidente do Conselho Executivo do
Agrupamento de Escolas de …………………
(Nome)………, portador do BI nº …… professor(a) ……………………….(situação profissional, residente em………………………………………………, ……..-……… (CP-Localidade), vem junto de V. Ex.ª requerer o pedido de pagamento de horas extraordinárias referente à distribuição de serviço que lhe foi feita para a introdução de dados dos encarregados de educação, no processo aquisição de computadores do Programa e.escolinha. Este serviço ultrapassa, em …… horas, o meu horário semanal de componente de trabalho de estabelecimento, uma vez que esta já está ocupada com outras actividades que integram o horário que em tempo V.Ex.ciª me atribuiu.
Com os meus cumprimentos.
Aguarda deferimento.
O (A) professor (a)
domingo, outubro 19, 2008
Acção (de)Formação do Magalhães
SEJAM LIVRES, PORRA!
29 09 2008Quando escrevi o artigo de opinião, que se encontra no final deste texto, acerca da Acção de Formação sobre o «Magalhães» que teve lugar nos dias 25 e 26 de Setembro, estava a léguas de imaginar a celeuma jornalística que iria causar. Que o meu blogue já é visitado por milhares de pessoas, isso eu sabia, mas nunca que este artigo fosse causar tanto apetite à comunicação social, como se de algo transcendental se tratasse. Se calhar nem notícia chega a ser, mas enfim…
Depois de, nas últimas horas ser autenticamente entupido de chamadas e solicitações de rádios, televisões e jornais e de a todos dizer que nada de noticioso me parece haver na crónica, a não ser uma simples opinião contra os conteúdos e metodologia de uma Acção de Formação, eis que quase todos os jornalistas questionam o comportamento dos meus colegas na dita sessão; contudo, tive o cuidado de deixar claro que nada tenho a opinar sobre isso e que cada um se deve responsabilizar pelos seus actos. Apenas achei ridículas aquelas actividades, devido à sua completa descontextualização relativamente ao que eu esperava da Acção. Frisei, até, que as senhoras americanas foram muito impressionadas com a capacidade criativa dos professores; agora, tudo isto numa «sessão de trabalho com a Intel»? Essa não!
Mas o que me choca no meio de tudo isto, e é por isso que escrevo este texto, é que todos os jornalistas com quem falei tentaram obter opiniões de muitos outros intervenientes na Acção e todos se recusaram a dar a cara ou uma simples opinião. Ora, parece-me, ou aliás, tenho a certeza, que as pessoas vivem hoje amedrontadas e parece que a Comunicação Social é algum papão para lhes desgraçar a vida.
Eu gostava que todas as pessoas se sentissem livres, num Estado livre e não se coibissem de dar uma simples opinião que seja. Cidadãos interventivos e activos é que constroem uma sociedade democrática e participada.
Entristece-me assistir a milhares e milhares de professores que vão gritando para dentro, chamando nomes feios a Governo e governantes, mas depois perante uma câmara ou um microfone, parece que algo os amedronta, como se dizer que discorda da Ministra, faça com que esta, no dia seguinte, os exonere!
A todos esses quero dizer que o Governo agradece tal atitude e enquanto ela se mantiver, farão de vós o que quiserem. Não adianta juntarem-se aos milhares na rua e depois manterem-se escondidos atrás de um anonimato cobarde.
Sejam livres, porra! Dêem, pelo menos, a vossa opinião civilizadamente! Um sociedade de cidadãos amedrontados de, sequer, opinar, não é uma democracia. No dia que eu sentir que não sou livre de dizer o que penso, embalo a trouxa e, qual Zeca Afonso, zarpo daqui para fora!
Paulo Carvalho
(de)FORMAÇÃO «MAGALHÃES»Sou coordenador TIC do meu Agrupamento de Escolas e fui convocado para me deslocar ao parque tecnológico de Cantanhede para receber formação sobre o tão propalado portátil Magalhães. Lá fui eu para dois dias de trabalho, cujo programa era, em 90%, composto pela expressão « jornada de trabalho com a Intel»:
Hoje estou aqui para relatar aquilo que se passou naqueles dois dias, e se o estou a fazer, é porque algo de relevante se passou.
Pelas reacções que tinha lido nos fóruns relativamente às mesmas sessões de Porto e Lisboa, já ia a contar que aquilo não seria o que eu esperava; mas longe de mim imaginar que iria assistir a uma coisa absolutamente surreal.
Primeira nota triste do evento: a organização distribuiu «pen drives» de um Gb, oferta da Intel contendo toda a documentação. Acontece que tinham umas 100 unidades para dar a 200 pessoas. Claro que metade (incluindo eu) ficámos a ver navios, havendo dignos colegas que se açambarcaram de mais que uma, facto que também não me causa qualquer espanto, até pelo facto de ninguém imaginar que não haveria «pen drives» para todos. Mas para a Organização tratou-se de mais uma normalidade!
Comecemos pela manhã de Quinta-feira, onde fomos levados, em grupos, para pequenas salas do complexo, onde supostamente nos iriam ser dadas directrizes relativamente ao Magalhães e às suas potencialidades em contexto educativo, para nós transmitirmos aos professores do 1º ciclo. Aliás, esse deveria ter sido o grande objectivo deste encontro; recebermos formação para a replicar junto das escolas envolvidas.
Ao invés disso, e para ser muito mais sucinto do que gostaria nesta crónica, somos brindados com apresentações de powerpoints em português, lidas em Inglês com sotaque russo, traduzido por senhoras contratadas para o efeito, como se nunca tivéssemos ouvido uma palavra em Inglês na vida e como se isso fosse o entrave à formação. Num parque dito tecnológico, as redes funcionavam mal ou não funcionavam, ninguém sabia ligar, o senhor russo ia ironizando como se estivesse num país de 3º mundo e a senhora tradutora ia tentando fazer a uma espécie de ponte entre surdos mudos. A seguir, mais um estrangeiro qualquer a debitar informação em inglês sobre um powerpoint em português e depois apareceu um brasileiro (ena!!! Um brasileiro!!!) mas que nada de útil nos transmitiu.
Ou seja, depois de uma manhã onde absolutamente ninguém aprendeu nada de útil sobre os Magalhães que qualquer jeitoso de informática não domine, ninguém imaginava que o pior estava para vir.
Eis que pelas 14 horas iria começar uma das melhores sessões de circo a que os meus olhos assistiram até hoje. O speaker de serviço que ostentava na lapela uma identificação de uma empresa que não conheço, mas que nem era do ME nem da Intel nem da JP Sá Couto, apresentou as três senhoras que tinham vindo expressamente dos States, com chancela da Intel, para nos brindarem com uma sessão de trabalho inolvidável. Eis que aparecem 3 senhoras com ar de quem está reformado há 20 anos, nos EUA, mas que em Portugal estariam no auge da carreira. Depois das simpatias ao país e de demonstrar que nada de útil iriam transmitir, resolveram propor aquilo que as trouxe ao, pensam elas, Burkina Fasso da Europa. Desde logo me demarquei e senti vontade de abandonar a sessão, mas os colegas… ah e tal… esquece isso… e tal…. Não te enerves… isto é sempre assim… e tal! Continuei a assistir e a incredulidade ia aumentando.
Aquelas 3 senhoras, acham que uma sessão de trabalho com a Intel é propor a 200 professores que inventem uma cantiga ao Magalhães, e se possível com teatro à mistura. Como eu e mais alguns colegas (muito poucos) mostrámos alguma estupefacção pelo que se estava a passar, uma das senhoras americanas apressou-se a dizer, bem alto e em tom ameaçador, que quem não participasse não seria incluído no sorteio de um Magalhães que iriam oferecer.
E, meus caros leitores, era ver 200 professores imbuídos naquela actividade com todo o afinco; sei que muitos grupos trabalharam online pela noite dentro e ao outro dia de manhã, os meus olhos ficaram estarrecidos com a produção apresentada. O desfile dos «trabalhos», (era assim que lhe chamavam) começou, e desde o malhão do Magalhães, até à vida de marinheiro do magalhães, passando por coreografias com adereços circenses, tudo de «útil» passou por aquele palco, até as náuseas me obrigarem a sair. Apenas voltei a entrar para ir junto da senhora que tinha o saquinho das senhas para o sorteio e dizer-lhe que não iria colocar lá o meu papelinho.
Conclusão: à bela maneira dos professores portugueses, que são exímios na arte de obedecer, mesmo não concordando, e na arte de produzir conteúdos, ainda que lúdicos (pena ter sido num contexto absurdo), toda a gente parecia achar aquilo ridículo, mas apenas eu e o meu amigo Paulo Pereira resolvemos sair e mostrar a nossa indignação a uma senhora representante do PTE que, educadamente, tal como eu na abordagem que lhe fiz, esgrimiu as fundamentações para aquelas «sessões de trabalho com a Intel».
Salvou-se a Microsoft e a Caixa Mágica que, na sexta à tarde, nos mostraram, finalmente, algo de útil; no final pedi a palavra para dizer que apenas aquela tarde se tinha salvo no meio das inutilidades que caracterizaram aqueles dois dias, o que, pasme-se, faz arrancar um caloroso aplauso da plateia.
Alguém me explique como se eu tivesse 8 anos, como é possível convocar 200 professores para dois dias de trabalho com a Intel, com a apresentação do «Magalhães» em pano de fundo e, basicamente, 3 senhoras americanas, apoiadas por pessoas de… uma empresa (!), gastarem um dia a obrigar-nos a produzir teatrinhos e cantigas para miúdos de 6 anos, outro meio dia gasto com russos a lerem powerpoints em pseudo inglês, escritos em Português, com tradução por senhoras contratadas.
Como professor e coordenador TIC senti-me vexado nestes dois dias. Aquelas senhoras devem pensar que somos um bando de imbecis e nunca vimos um computador na vida; tudo isto pago pela DREC, cuja Directora, no final, enalteceu o evento.
Relativamente aos meus colegas, mostraram, como sempre, que tudo são capazes de fazer, mesmo o ridículo, mas ficou, essencialmente, a prova de como não há-de o Ministério fazer de nós gato-sapato a seu bel-prazer!!!
Nota: O Magalhães é um excelente equipamento e, mesmo sem aposta na formação e com esta atabalhoada distribuição, julgo ser uma mais valia efectiva para a modernização do caquéctico ensino do 1º ciclo em Portugal.
Aqui fica um video que apanhei durante uma das actuações que mais aplausos arrancaram.
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P. C. (ver blogue)
sexta-feira, outubro 17, 2008
Ensaio da Municipalização
quarta-feira, outubro 08, 2008
Santana Castilho: "O Magalhães, o porco e o Sócrates (o outro)
01.10.2008, Santana Castilho
Fornecer tecnologia sem cuidar da literacia que a permite utilizar é drasticamente pobre
Sobre o Magalhães (refiro-me ao computador português feito no estrangeiro) já se escreveram muitos e interessantes comentários, uns a favor e outros contra. Tudo visto, parece-me que resta uma generalizada (mas para mim preocupante) aceitação da medida. Ouviram-se escolas e professores sobre a iniciativa? Não, porque por elas pensa a ministra, para quem o Magalhães constitui "o instrumento principal da democratização do ensino"; ponderou-se o impacto que a tecnologia tem na melhoria do aproveitamento escolar dos jovens, analisando estudos disponíveis sobre a matéria, que concluíram pela sua irrelevância? Não, porque o coordenador do Plano Tecnológico já disse ao que vai: dois alunos por computador em 2010!
Dou de barato não saber que critérios presidiram à escolha deste computador e não de outro, da Intel ou da empresa de Matosinhos, e simplesmente não engulo a fantasia da ausência de custos para o Estado. Mas o que acho verdadeiramente preocupante é a generalizada adesão ao culto duma modernização pacóvia, que tudo resume ao mero mercantilismo (e não utilitarismo, como muitos impropriamente referem o conceito que, enquanto teoria filosófica, é coisa bem diferente). A formação sólida, que constitui a missão da Escola e dos professores, deve assentar numa clara hierarquia de valores: primeiro o conhecimento puro, depois o instrumental. Mas o que se tem feito ultimamente é a secagem das actividades cognitivas, substituindo-as pelas meramente instrumentais. Foi assim que se trocaram clássicos da literatura por textos ditos pragmáticos (simples formulários, notícias jornalísticas ou mensagens publicitárias) e se preferiram as actividades conducentes à aquisição de "competências" em detrimento das actividades de forte componente cognitiva. Foi assim que se enfraqueceu o ensino da Gramática, da Filosofia e da História e se reforçaram iniciativas híbridas ("área projecto" e "estudo acompanhado"). Surpreendente? Não, se tivermos em vista que quem decide são tecnocratas deslumbrados pela tecnologia e convencidos que os "bichavelhos" são suficientes para educar o povo.
Parece-me evidente que há mais gente satisfeita com este bodo de Magalhães a eito que gente insatisfeita e ciente, como eu, de que as crianças do ensino básico não vão aprender melhor a ler e a interpretar o que lerem por causa dos computadores; ou de que não aprenderão mais cedo e melhor a Matemática fundamental por via do Magalhães; ou de que não se iniciarão precocemente na actividade de pensar e perceber o que as rodeia, por via do portátil. E é aí que reside o problema: fornecer tecnologia sem cuidar da literacia que a permite utilizar é drasticamente pobre. O impacto da componente cognitiva do ensino só pode ser comparado com o da sua vertente instrumental por quem conhece as duas e tem do exercício profissional uma autoridade que os tecnocratas desprezam. O tecnocrata é por norma e por formação pouco sólida um fanático da tecnologia, que com ela se satisfaz e nem sequer aprende com a natureza efémera de tantos projectos tecnológicos (lembram-se do ensino assistido por computador, do Minerva, do Nónio, das Cidades Digitais e do endereço electrónico para cada português, entre outros?).
Stuart Mill referiu-se assim a esta questão fundamental do pensamento e da natureza humana:
"É indiscutível que o ser cujas capacidades de prazer são baixas tem uma maior possibilidade de vê-las inteiramente satisfeitas; e um ser superiormente dotado sentirá sempre que qualquer felicidade que possa procurar é imperfeita. (...) É melhor ser um ser humano insatisfeito do que um porco satisfeito; um Sócrates insatisfeito do que um idiota satisfeito. E se o idiota ou o porco têm opinião diferente, é porque apenas conhecem o seu lado da questão. A outra parte da comparação conhece ambos os lados..."
Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)